“Farsa” da Liga
16 anos depois, a Taça da Liga continua a (tentar) reinventar-se. A organização não percebeu que já não há espaço- nem paciência- para invenções.
A criação da Taça da Liga teve como protagonistas o Sporting CP e o Boavista FC, na temporada 2006/2007, após proposta conjunta dos clubes lisboeta e nortenho. O problema surgiu logo desde início. Gilberto Madaíl, na altura presidente da Federação Portuguesa de Futebol (FPF), após aval positivo por parte da Liga, questionou a conveniência da existência de mais um torneio de cariz nacional. Porém, a verdade é que, na época seguinte, a mesma já teria o seu início, tendo o Vitória FC vencido a competição, curiosamente, frente à formação leonina.
No passado dia 15 de maio, os clubes profissionais aprovaram (mais) um novo formato da Taça da Liga, a arrancar na época 2024/2025. Esse mesmo modelo admite a participação de 8 equipas, as quais, no fim da época anterior, tenham terminado entre os 6 primeiros postos da Primeira Liga e nos 2 primeiros lugares da Segunda Liga. Se, por um lado, a Taça de Portugal é a competição mais democrática a nível nacional, o mesmo não se pode dizer da Taça da Liga. Com a aprovação deste formato, apenas clubes que, à data da competição, estejam no mais alto patamar do futebol português poderão ter a oportunidade de jogar esta prova. Para além disto, os adeptos das equipas participantes poderão vir a ser prejudicados. Tal se deve ao facto de Pedro Proença, Presidente da Liga Portugal, ter admitido, no fim do ano passado, a intenção de internacionalizar a competição referida, remetendo a ‘final-four’ para o estrangeiro, à semelhança do que acontece com a Supertaça de Espanha, por exemplo. Estas são apenas algumas decisões, no mínimo questionáveis, de uma competição muito polémica.
O reflexo daquilo que é a Taça da Liga assenta, pois claro, na final de 2008/2009. Na sua 2ª edição, a decisão opôs os 2 ‘grandes’ de Lisboa, no Estádio Algarve. Essa final ficou marcada por um lance capital muito mal ajuizado por parte Lucílio Baptista, árbitro dessa partida. A cerca de 15 minutos do fim do tempo regulamentar, e com 1-0 no ‘scoreboard’ a favor dos leões, a bola bate no peito de Pedro Silva, central dos verde-e-brancos, após toque de Di María, então jogador do SL Benfica, no interior da grande área. Lucílio Baptista interpreta mal o lance e assinala grande penalidade para os vermelhos da Capital. Incrédulo com a decisão da equipa de arbitragem, Pedro Silva reage mal, dando um encontrão no juiz. Acaba por ser expulso. Nessa mesma altura, Paulo Bento é apanhado pelas câmaras com um gesto que indicava, tal como o mesmo assumiu na conferência de impressa, que “estava a ser roubado”. No final da partida resolvida apenas após a conversão de grandes penalidades e que permitia ao SL Benfica conquistar a 1ª Taça da Liga (de 7) da sua história, o atleta que havia sido expulso arremessa a medalha de 2º lugar para bem longe. Quase 10 anos depois, em entrevista ao jornal O Jogo, o defesa brasileiro afirmou que, após esse lance, a “Taça da Liga ficou descredibilizada”.
As contínuas alterações de formato da Taça da Liga são demonstrativas da dificuldade desta em ser bem acolhida tanto pelos intervenientes do jogo como pelos adeptos. A incapacidade da Liga em, de uma vez por todas, estabilizar o modelo competitivo parece perpetuar a pouca importância dada à competição. Não é por acaso que os principais clubes portugueses não raras vezes utilizam esta taça para descansar jogadores mais importantes. Isso foi-se tornando de tal modo um hábito que a organização da prova recorreu à imposição de obrigatoriedade de participação de “cinco jogadores que tenham sido incluídos na ficha técnica (efetivos ou suplentes) em um ou dois jogos oficiais imediatamente anteriores da época em curso”. Ainda que nos últimos anos esta competição tenha conseguido superar-se, ganhando, gradualmente, o apreço dos envolvidos, mas, em especial, da massa adepta, com a criação da ‘final-four’ e respetivas ‘fanzones’, a verdade é que este novo formato, na minha ótica e na de muitos outros adeptos, é potencialmente um tiro no pé por parte de quem tutela o torneio e um retrocesso naquilo que tem vindo a ser conseguido no último par de anos, sobretudo após a queda da hegemonia do SL Benfica nesta mesma competição.
Assim, a sobrevivência da Taça da Liga pode estar posta em causa. Dificilmente os clubes em prova darão prioridade a este torneio em detrimento das demais, já que o facto de haver menos equipas a participar transmite a ideia de menor profissionalismo. É essencial que seja repensada a importância de mais um evento desportivo que há mais de 15 anos se tenta reinventar para agradar à maior parte dos envolvidos.
Manuel Brito Henriques
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