Os Invencíveis de Wenger
Começou como “Arsène who?”, e acabou como Le Professeur.
Perguntar a um grupo de adeptos de futebol qual é a melhor equipa de sempre é sinónimo de entrar numa discussão que dificilmente atingirá uma unanimidade. Os mais novos falarão do Real Madrid e dos diferentes plantéis que conquistaram 5 Ligas dos Campeões na última década, outros defenderão que jamais se formará uma equipa como a do Barcelona de Pep Guardiola. Uns não esquecem que os comandados de Alex Ferguson chegaram ao treble em 99, depois da mítica final em Camp Nou, frente ao Bayern. Outros, e com mais anos disto, farão questão de exaltar o Ajax de que Johan Cruyff fez parte e a suprema importância que teve no futebol a que hoje assistimos.
No meio do saudável desentendimento, haverá certamente alguém a olhar para o topo da tabela da Premier League e a recordar a última vez que o Arsenal conquistou o campeonato inglês - foi há quase duas décadas que Arsène Wenger deu vida aos “Invencíveis” e também eles merecem fazer parte desta conversa. Em 2003/04, o Highbury Stadium, antiga casa do gunners, via nascer uma equipa que ficaria para sempre marcada na história do futebol.
Arsène Wenger, natural de Estrasburgo, nunca foi brilhante com a bola nos pés e desde cedo apostou na carreira de treinador. Começou por representar o Nancy na década de 80 e rapidamente deu o salto para palcos maiores. Foi ao serviço do Mónaco, clube que comandou durante 7 temporadas, que instaurou uma revolução e deu nas vistas pela primeira vez. Conhecido por ser um técnico muito ambicioso, Wenger alterou drasticamente o método de treino e controlou a rotina dos seus jogadores. Foi campeão da liga francesa na sua época de estreia e partiu mais tarde para o Japão, onde repetiria esse feito.
Em 1996, chegou ao Arsenal e as primeiras conquistas não demorariam muito a aparecer. No ano que se seguiu à sua entrada, conquistou o campeonato e a taça. Porém, Alex Ferguson, Peter Schmeichel e companhia depressa colocariam um ponto final na sua ascensão e o Arsenal não voltaria a vencer a liga tão cedo.
Enquanto a hegemonia do Manchester United durava, o Arsenal viu sair Marc Overmars, Ian Wright e Nicolas Anelka – Wenger ia modelando o plantel ao seu gosto. Em sentido contrário, chegou o já campeão do mundo Thierry Henry, contratação mais cara do clube até então e que dispensa apresentações. O clube de Londres voltaria a ser campeão e o treinador francês afirmava pela primeira vez que não era impossível passar uma temporada inteira sem perder, dando assim início ao sonho da invencibilidade. Para repetir o que só o Preston North End havia conseguido fazer, Wenger apostou no 4-4-2 e começou por reforçar a baliza – Jens Lehmann veio substituir David Seaman.
Dos Camarões chegou Kolo Touré por menos de 200 mil euros para fazer dupla com o experiente central Sol Campbell, antigo capitão do Tottenham. As laterais eram compostas por Ashley Cole e Lauren, o jogador mais discreto deste 11 inicial. Mais à frente no campo, Gilberto Silva, destaque do campeonato do mundo de 2002, trouxe a liberdade que Patrick Vieira precisava. Vieira é visto por muitos como a peça mais fundamental desta equipa: capitão imponente, atacava, defendia e até rivalidades comprava – Roy Keane que o diga.
Nas alas, Fredrik Ljungberg chegou da Suécia e rapidamente conquistou os adeptos com a sua atitude (“We love you Freddie, cos you’ve got red hair / We love you Freddie, cos you’re everywhere”). Do outro lado, Robert Pirès atingiu as duas dezenas de golos e encantava pela sua relação com a bola. Dennis Bergkamp, jogador que tem uma estátua à porta do Emirates Stadium (“There’s only one Dennis Bergkamp”), estava já em final de carreira, mas nem isso o impediu de fazer uma brilhante época: corria, fintava e encontrava espaços que nenhum defesa sonhava existirem. O seu controlo de bola era invejável e foi essencial para a peça que completa este conjunto. Thierry Henry é considerado pela larga maioria como o maior jogador da história do Arsenal e um dos maiores da história da Premier League, e também ele tem uma estátua em frente ao estádio. Veloz, hábil e exímio enquanto finalizador, apontou 30 golos no campeonato e colocou os gunners mais próximos da invencibilidade. Outros jogadores como Edú, Reyes e Ray Parlour foram também determinantes nesta caminhada.
Em 2003/04, o Arsenal de Wenger terminou a época com 26 vitórias, 12 empates e 0 derrotas. Marcou 73 golos, sofreu apenas 26 e presenteou-nos com inesquecíveis momentos como a Battle of Old Trafford – onde Vieira acabou expulso e Van Nistelrooy foi herói – a reviravolta frente ao Liverpool – com três golos de Henry – e a segunda parte do jogo frente ao Leicester no Highbury Stadium, a contar para a última jornada do campeonato.
“A vida é feita de milímetros. Falamos dos Invencíveis, mas por uma questão de milímetros eles não existiriam.” – Arsène Wenger
José Maria Pinto
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