“Suor, sangue, lágrimas, alegria, tristeza, amoR, irmãos, história, coração, eternidade”. Assim, com um post no seu Instagram, José Mourinho disse adeus à Roma, após ter sido despedido a 16 de janeiro deste ano. Levou a Roma à glória europeia da Conference League em 2022, alcançando ainda a final da Liga Europa em 2023, no meio de prestações inconstantes na Serie A. Mais de um mês depois, a Roma leva 6 jogos, com 4 vitórias (todas para o campeonato), um empate com o Feyenoord na primeira mão do play-off de acesso aos oitavos da Liga Europa (cuja segunda mão se joga hoje) e uma derrota com a Inter (dona e senhora da Serie A este ano). Mourinho puxava a equipa para trás? O que se segue no seu futuro?
Caros leitores, Mourinho é um romântico. Gosta de ser desafiado. Olhem para a sua carreira: Porto, onde levou um clube periférico a dominar a Europa; Chelsea, onde quebra a hegemonia de Man United e Arsenal internamente; Inter, onde conquista um triplete histórico; Real Madrid, onde teve de se superar a uma das melhores equipas de sempre; Man United, onde procurou reerguer um histórico que ele próprio ajudou a destronar; Tottenham, caso sem solução; e Roma, mais um clube fora dos dominadores em Itália. O ponto em comum é o desafio. Não gosta de equipas feitas, nem de campeonatos dados. Isso não o motiva. Obviamente que isto não o desresponsabiliza se o projeto falhar, mas também ajuda a compreender quando não sucede.
Ainda assim, Mourinho na Roma foi um sucesso. Trouxe o primeiro título para o clube desde 2007 e o primeiro título europeu da Roma desde 1961 (Taça das Cidades com Feira). Uniu os adeptos em torno do clube como nunca, por ser o homem do povo que é, tendo a Roma batido o seu recorde de bilhetes de época vendidos em 2023, com 40 000. Conseguiu atrair talentos gigantes em termos de impacto, sendo low cost ao mesmo tempo. Tirando o grande investimento da sua primeira época, onde foi comprado Tammy Abraham por 41M€, por exemplo, Dybala, Matic, Belotti e Auoar juntaram-se ao clube a custo zero; Lukaku, Wijnaldum e Renato Sanches por empréstimo; e Paredes por 2,5M€. Para um clube que podia pouco ou nada gastar devido às imposições do fair-play financeiro da UEFA, nada mau.
Porém, a irregularidade na Serie A e o azar da final da Liga Europa frente ao Sevilha custaram uma coisa de que a Roma necessitava urgentemente: os milhões da Liga dos Campeões. Na época 22/23, a Roma registou um saldo negativo de 102M€, ainda assim melhor do que o de 21/22: uns negativos 219M€. Num clube neste estado, é impraticável Mourinho receber 14M€ por época, mais do que os 9M€ que a Roma gastou no mercado em 22/23, por exemplo.
Logo, acho que, se a Roma estivesse numa melhor situação financeira, Mourinho ainda estaria ao leme dos italianos, possivelmente com melhores resultados, devido a um maior investimento no plantel. Logo, bastava um penálti ter sido diferente naquela final de Liga Europa em Budapeste para muita coisa não ter corrido como correu. O futebol custa a engolir às vezes. Ainda mais doloroso fica quando ouvimos Mourinho a falar sobre a sua passagem pela capital italiana (declarações ao podcast Vibe with Five, de Rio Ferdinand):
"Posso dizer que foi a única [saída] que mais me magoou. Dei tudo, dei o meu coração, dei até algumas opções que poderiam ser consideradas não muito inteligentes do ponto de vista profissional."
"Normalmente sou muito pragmático nas minhas escolhas, muito profissional nas minhas escolhas e tento ser muito controlado emocionalmente, e isso nota-se quando deixo outros clubes depois de ganhar finais. Neste caso, não fui pragmático, fui emocional e dei tudo. Por isso, no final, quando saí, saí magoado. Tive a grande sensação de ter dado tanta felicidade às pessoas."
"Duas finais europeias consecutivas não acontecem muitas vezes, especialmente num clube como a AS Roma, que não tem um grande historial de sucesso europeu. Depois, estava a andar na rua e as pessoas diziam 'leva-nos a Dublin, leva-nos a Dublin' [para a final da Liga Europa deste ano] e eu tinha isso na cabeça, a terceira final europeia consecutiva.”
E o futuro? Vamos lá estudar hipóteses, atribuindo um nível de probabilidade de 0 a 10.
Arábia Saudita
Financeiramente, era o que faria mais sentido. O próprio Mourinho já demonstrou interesse em eventualmente treinar lá, apesar de ter rejeitado uma proposta, de modo a continuar na Roma. Porém, acho que não é para já. Partiram-lhe o coração com esta separação, mas ele vai voltar em força e com o desejo de ser desafiado. A Arábia não é apelativa nesse sentido. Talvez mais tarde na carreira. Probabilidade: 4/10
Seleção Nacional
Sempre sonhámos ver Mourinho no cenário internacional, ainda para mais neste momento da carreira, onde competições a eliminar são mais o seu forte do que as de regularidade. Já imaginaram vermos Mourinho num Mundial? A epopeia que seria escrita… Contudo, num futuro próximo, não será por Portugal. O tio Bob só tem vitórias e, mesmo que não vença o Europeu, seria necessário um desastre de proporções épicas para ser despedido. Portugal não dá para já, mas há selecionadores que não têm tanta confiança das suas federações como Roberto Martinez. Inglaterra, que ele rejeitou em 2007, Alemanha e Espanha são exemplos claros que podem estar a um mau Euro 2024 de ficarem livres. O Brasil de Dorival está a uma má Copa América do mesmo cenário. Quem sabe. Probabilidade: 6/10
Agora vamos às hipóteses mais divertidas:
Bayern de Munique
“Ah, mas tu em cima dizes que o Mourinho só gosta de desafios e agora vens falar do Bayern?”. Sim. O Bayern deve ser dos cargos mais desafiantes no futebol atual. A nível desportivo, após 10 anos seguidos a ganhar a Bundesliga, a coisa muito provavelmente vai mudar de figura, graças a um tal de Xabi Alonso. Desde a vitória em 2020, também já não impõe o mesmo respeito na Liga dos Campeões. Para além disso, Thomas Tuchel vai sair do clube no final da época, devido a maus resultados e a choques com a indisciplina de alguns jogadores. A nível financeiro, está confortável no plano interno, mas longe da realidade dos clubes da Premier League e do Real Madrid, o que não torna o clube alemão num favorito na luta pela Champions. Esta desigualdade de realidades até fez a Bundesliga procurar um investidor externo, ideia abandonada devido a protestos dos adeptos. Probabilidade: 7/10
Barcelona
O quão poético seria toda uma geração ter sido ensinada que só podia adorar ou Mourinho, ou o Barcelona, nunca os dois, para os ver juntos? Muito, muito engraçado que isto seria. Acho pouco provável. Pelas memórias do início da década de 2010, onde o Real Madrid de Mourinho foi a maior kryptonite do melhor Barcelona de sempre; e por ser algo completamente distinto à filosofia de jogo do Barça, criada por Johan Cruyff, também ele pouco fã de Mourinho: “Mourinho não é um treinador de futebol, mas de títulos. Não é um técnico de futebol se olharmos para este desporto como um espetáculo para os adeptos, seja no estádio ou em direto (2011).” Porém, com a saída de Xavi no final da época, fica a dúvida no ar. Probabilidade: 2/10
Chelsea
Não há 2 sem 3? Prova isso, José. Este Chelsea precisa de alguém que foque as atenções todas nele, para apagar alguma incompetência de uma direção pouco organizada, mas com muitos recursos. Inglaterra já foi a praia de Mourinho e acho que se daria bem lá outra vez. Quando chegou lá em 2004, deu ao Chelsea a sua primeira Premier League em 50 anos, rompendo com a mediocridade instalada. Era fazer igual. Os únicos motivos que podem romper este casamento são uma possível leadade de Todd Boehly a Pochettino e de Mourinho a Roman Abrahamovic. Probabilidade: 5/10.
Nápoles
Itália? Check. Enorme massa adepta? Check. Recursos financeiros? Check. Dificuldades em renovar-se futebolisticamente após um título inédito, tornando o cargo desafiante? Check. Tem a cara de Mourinho, mas apenas se ele conseguir esquecer os sentimentos pela ex. Probabilidade: 7/10
João Blanco (Estou de volta.)
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