União não falta, mas será que chega?
A análise do 78 à convocatória de Roberto Martínez para o Euro 2024, na Alemanha.
Diogo Costa, José Sá, Rui Patrício, António Silva, Danilo Pereira, Diogo Dalot, Gonçalo Inácio, João Cancelo, Nélson Semedo, Nuno Mendes, Pepe, Rúben Dias, Bruno Fernandes, João Neves, João Palhinha, Otávio, Rúben Neves, Vitinha, Bernardo Silva, Cristiano Ronaldo, Diogo Jota, Francisco Conceição, Gonçalo Ramos, João Félix, Pedro Neto e Rafael Leão. Estes são os 26 portugueses escolhidos por Roberto Martínez para reconquistar o título de campeão europeu, perdido em 2021, quando a Itália venceu a Inglaterra.
Não há surpresas, o que, por si só, acaba por também não ser uma grande surpresa. Desde cedo, Martínez criou o seu núcleo duro dentro das “quinas”, com uma base de cerca de 20 jogadores, utilizando as restantes vagas como experiências (caso de Francisco Conceição) e possíveis candidatos futuros a esse núcleo duro.
A resistência à mudança é, e foi, até agora, um dos poucos pontos duvidosos que é apontado ao selecionador espanhol. O primeiro grande caso deu-se quando João Cancelo e João Félix entraram nas escolhas de Martínez quando não colecionavam minutos há meses, impedindo que novas caras se pudessem apresentar ao público português, e à equipa técnica. Outras situações seguiram-se, com especial atenção a muitos amigáveis, onde jogadores com poucos minutos, ou em regresso de lesão, foram selecionados em detrimento da meritocracia, que justificava a vinda de outros jogadores (Bruma, Trincão, Jota Silva, Pedro Gonçalves, etc). No entanto, esta resistência não tem de ser perceptível como algo negativo em todas as situações.
É absolutamente indispensável para uma seleção contar com um núcleo duro. As rotinas de treino mantêm-se, os jogadores já contam com uma ligação que beneficia o coletivo, conhecendo-se dentro e fora de campo. Tudo isto cria uma enorme coesão e entrosamento entre a equipa, que acaba por se catapultar para uma maior estabilidade, que será melhorada ao longo do tempo, e visível dentro de campo. Este é, certamente, um dos pontos que Roberto Martínez mais valoriza numa seleção, não houvesse apenas três mudanças entre a sua primeira convocatória, e a mais recente.
No entanto, este grupo de jogadores com “lugar cativo” (de forma justa) deverá sempre ser exposto a novos jogadores, a novas ideias, a novas características, com a eventual substituição de algumas peças que começam a perder não só rendimento dentro de campo, mas a sua influência e benefício para o grupo fora dele. É neste aspeto que devemos (por exemplo) olhar para Rúben Amorim, que soube pegar num núcleo duro do Sporting, e, ao longo dos anos, foi adaptando (nem sempre com sucesso) o plantel aquilo que pretendia, sem medo de retirar peças desse núcleo duro, conseguindo assim projetar novos jogadores para outras responsabilidades, nunca prejudicando o clube com isso.
Entre os postes, não existiam grandes dúvidas. Diogo Costa entra como primeira escolha, com Rui Patrício como uma das vozes do balneário e José Sá como segunda escolha. Rui Silva será sempre uma opção viável, mas Roberto Martínez nunca pareceu aberto a essa mudança. Ricardo Velho era uma escolha que apenas os mais românticos acreditaram.
Jogando com quatro defesas (como será expectável na fase de grupos) ou com cinco defesas (será certamente uma nuance a ter em conta nas fases avançadas da competição), Roberto Martínez leva um lote defensivo que não surpreende. João Cancelo e Diogo Dalot deverão assumir a titularidade, já que Nuno Mendes falhou grande parte das convocatórias devido a lesão (chegou-se a questionar se faria parte desta lista há uns meses). Nélson Semedo surge como quarta opção, em detrimento de Toti Gomes, a única opção realista (do selecionador) para esta defesa a ficar de fora. Raphael Guerreiro não entrou nas contas, o que sugere claramente a adaptação de Cancelo para o lado esquerdo da defesa, ou até como ala num sistema a cinco.
Rúben Dias, Gonçalo Inácio e António Silva entram diretamente como escolhas obrigatórias e expectáveis. Surge aqui, as primeiras questões nesta convocatória. Pepe está a contas, desde Abril, com uma lesão no tendão e, com 41 anos, é pouco provável que consiga recuperar a sua forma física por completo até ao início da competição. Será por aí que (a nosso ver), Danilo entra nesta convocatória sem grandes questões. Entra aqui o que referimos acima. Não seria nada descabido deixar Pepe de fora e, no seu lugar, apostar (por exemplo) em Diogo Leite, um central canhoto, juntando assim três destros (Danilo, Dias e Silva) e dois canhotos (Leite e Inácio). Diogo seria também um central com rotinas a jogar com três centrais.
E se João Palhinha, João Neves, Vitinha e até Danilo Pereira dão garantias não só na zona mais recuada do miolo, mas como até em zonas interiores (Vitinha como interior esquerdo), o mesmo não se poderá dizer de Rúben Neves. Não querendo, de forma alguma, banalizar todo o talento que possui, é um nome que não traz grande diferenciação a esta convocatória, uma vez que com características semelhantes existem outros jogadores (até na relação com a baliza Vitinha já está ao seu nível). Existiria um substituto ideal para Rúben Neves, dadas as características do mesmo, mas já lá chegaremos.
Ao longo de todo o resto do meio campo, não existem grandes argumentos para deixar de fora Bruno Fernandes, Bernardo Silva e até Otávio. Existe sim lugar para promover a ideia de que nenhum destes médios apresenta características semelhantes a Matheus Nunes, jogador do Manchester City. É certo que, a performance e os minutos jogados por Matheus ao longo de toda a época não jogam a seu favor. No entanto, a escolha seria sempre para um lugar nesta seleção como um jogador para abanar o jogo vindo do banco, ou mesmo para explorar as características que dispõem através da sua velocidade, ou da facilidade com que queima metros com a bola no pé. Em certa altura neste Europeu (esperamos bem que não), a sua falta será sentida.
Chegando a terra de golos, Rafael Leão, Cristiano Ronaldo, João Félix, Gonçalo Ramos são peças-chave desta seleção, e tudo o que não fosse a sua inclusão, seria fugir a tudo aquilo que Roberto Martínez nos habituou. Surge, no entanto, aqui o maior debate sobre esta convocatória. Francisco Conceição estreia-se num Europeu e é merecida sem dúvida a sua convocatória. É o destaque do Porto numa época muito abaixo das expectativas, apresenta números que justificam a sua chamada, e, toda a sua integração nesta seleção foi feita da maneira correta. Francisco e a sua integração nos convocados deveria ser a prática usual dentro da seleção de Portugal. Sobram, assim, Diogo Jota e Pedro Neto. Normalmente, não seriam sequer motivo de dúvidas. Diogo Jota apresenta características que nenhum outro avançado na Seleção Portuguesa apresenta e, com base nos números apresentados pelo mesmo ao longo das últimas temporadas em Liverpool, seria uma escolha sem qualquer contestação. O problema com Diogo Jota recai na sua lesão que, tal como Pepe, já vem com um mês de duração.
Não seria esta a oportunidade perfeita para promover a chamada de um jogador com outras características à seleção, uma vez que apenas Jota Silva apresenta características relativamente semelhantes às suas e, neste momento, não seria a primeira opção?
Pensámos em Pedro Gonçalves que, embora tenha características muito diferentes de Diogo Jota e Pedro Neto (Francisco Trincão seria a opção mais semelhante), apontou uma época absolutamente merecedora desta convocatória. Já Pedro Neto, regressou no último jogo, não existindo preocupações tão grandes como com Jota e Pepe. Não deixa, mesmo assim, de estar abaixo do ritmo esperado para disputar esta competição, pelo menos, até ao momento. Com certeza que chegará com a motivação certa, apesar da lesão atrapalhar uma época que vinha a ser, até ao momento, simplesmente deliciosa.
Qualidade é uma palavra que pode descrever a nossa seleção. Nomes como Rui Silva, Raphael Guerreiro, Toti Gomes, Diogo Leite, Matheus Nunes, Pedro Gonçalves, Bruma, Francisco Trincão, até Paulinho eram opções válidas. Roberto Martínez preferiu o núcleo duro, a experiências novas no seio desta Seleção. Veremos no que resulta. A certeza é apenas uma, Portugal aparece como sério candidato à vitória da competição, munido de uma convocatória com um bocadinho de (quase) tudo.
João Pinto
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