Cavadinha Mundial: Análise das seleções sul-Americanas no Campeonato do Mundo
O Mundial 2023 chegou às meias-finais sem nenhuma das três seleções da América do Sul, que marcaram a atual edição com deceções e surpresas.
Mais uma semana, mais uma Cavadinha! Hoje, com o último artigo desta sequência voltada ao Campeonato do Mundo 2023, jogado na Austrália e na Nova Zelândia. Com a final agendada para o dia 20/8 (domingo), a prova encontra-se nas meias-finais, com um duelo europeu entre Espanha e Suécia dum lado e a equipa da casa, Austrália, a disputar com a campeã europeia Inglaterra a segunda vaga na final.
Sendo este um espaço dedicado ao futebol brasileiro, também o é, indiretamente, ligado ao futebol sul-Americano em geral. Assim, tendo também em consideração a ausência de seleções desse continente na fase em que a prova se encontra, concluímos a “Cavadinha Mundial” a fazer um resumo do que foi a participação das três representantes — Argentina, Brasil e Colômbia — na maior competição do desporto-rei.
Argentina, Brasil e Colômbia que, para além de ser a sequência que temos ao ordenar os seus nomes alfabeticamente, acabou por ser também a sequência em que as seleções foram eliminadas da competição. Sendo assim, tal será também a ordem seguida no texto.
Argentina: 4.ª colocada no Grupo G
Das três representantes, começamos com a que estava mais abaixo no ranking mundial da FIFA. Em 28.º, a verdade é que a Argentina não chegava à Oceânia com grandes expetativas. Num grupo em que contavam com a top-3 Suécia e top-16 Itália, o grande objetivo era, realisticamente, conseguir a primeira vitória da história da “celeste y blanca” em Mundiais.
Contudo, mesmo com o apuramento a ser uma realidade improvável, a Argentina decidiu apostar numa ideia de jogo mais “característica do futebol sul-Americano”, buscando abandonar a postura excessivamente defensiva. Jogar “para não perder” não estava dos planos da seleção e das suas jogadoras, incentivadas a dar tudo, competir, não baixar a cabeça.
E foi mesmo isso que fizeram. Apesar de ter saído derrotada por 1-0 na estreia frente a Itália, a Argentina fez uma partida inteligente e com muito sacrifício, chegando a conseguir até um certo domínio em momentos do encontro. Respeitou a rival, visto que não aguentaria uma partida constantemente intensa frente a uma seleção mais forte, mas mostrou autoridade e entrega, mantendo a missão de apresentar um jogo de muita pressão, disciplina e concentração.
A equipa personificou este espírito de luta, mas acabou por não chegar. Com o empate em 2-2 frente à África do Sul e outra derrota, desta vez por 2-0 frente a Suécia, a Argentina viu-se em último lugar no grupo e sem conseguir a tão sonhada vitória inédita, nesta que é a sua quarta participação.
“Com amor-próprio e garra já não é suficiente, é hora de mudar”, disse a lateral-direito Julieta Cruz (Boca Juniors) após a eliminação, reforçando a importância de desenvolver o futebol feminino no país — onde a profissionalização é ainda recente (2019).
O destaque do grupo acabou por ser a seleção Sul-Africana, que, mesmo sendo 54.ª no ranking, venceu e eliminou Itália, alcançando os oitavos de final pela primeira vez na sua história.
Apesar dos resultados, a participação argentina está longe de ser um grande fracasso. Tratando-se de uma equipa da qual pouco se esperava, a postura apresentada é bastante positiva e mostra haver potencial no país, basta querer trabalhar e investir nele.
Resumo:
Dificuldade do grupo - 7/10
Resultados obtidos - 5/10
Postura apresentada - 8/10
Conclusão: podia ter resultado melhor, mas não foi uma má participação.
Brasil: 3.º colocado no Grupo F
Após ter já realizado a análise dos três jogos do Brasil — Panamá, França e Jamaica —, não é preciso falar muito mais. A Seleção Canarinho chegava ao Mundial com grandes expetativas após ser campeã sul-americana e, sobretudo, após os ótimos jogos que fez antes do Mundial — uma Finalíssima altamente disputada frente a Inglaterra que só foi decidida em penáltis e uma vitória sobre a Alemanha num amigável.
Tratando-se ainda do último Mundial da lendária Marta, o sexto da sua carreira, criou-se «um sonho intenso, um raio vívido / De amor e de esperança», como diz no hino nacional do próprio Brasil. Num grupo com o Panamá e a Jamaica — 52.º e 43.º, respetivamente, no ranking da FIFA —, o esperado é que o Brasil disputasse a liderança do grupo com França e conseguisse o apuramento sem sustos.
A primeira parte, de facto, o fez: após uma estreia avassaladora, goleando o Panamá por 4-0, o Brasil chegou à segunda jornada a disputar com a França três pontos que garantiriam o apuramento aos oitavos. Contudo, uma primeira parte para esquecer não foi totalmente compensada pela segunda, resultando na derrota por 2-1 frente às gaulesas e a levar todo o clímax para a última jornada.
Bastava vencer por qualquer resultado, mas o forte jogo defensivo da Jamaica (que sofreu apenas um golo em toda a competição) levou o Brasil a fazer o seu pior jogo de toda a prova e não conseguir sair do empate, resultando numa inesperada eliminação ainda na fase de grupos.
De forma geral, o Brasil fracassou neste Mundial. Apesar do cenário do futebol feminino ainda estar longe do ideal, os últimos anos foram transformadores para a modalidade no país. Somado com a história que o Brasil tem na modalidade mesmo no passado, desta vez a falta de estrutura ou de apoio à modalidade, apesar de continuar a ser o tema-chave do futebol feminino não só no Brasil, mas em todo o Mundo, não serve de “justificação” para o resultado obtido. Tinham (e tem) mais estrutura, mais “nome” e mais experiência do que a Jamaica e vários outros países participantes.
O destaque ficou para as Jamaicanas, que fizeram história ao conseguir o seu primeiro apuramento aos oitavos, especialmente por ser num grupo com duas “pedreiras” como França e Brasil.
Resumo:
Dificuldade do grupo - 4/10
Resultados obtidos - 3/10
Postura apresentada - 5/10
Conclusão: O Brasil tem bases sólidas e várias jovens talentosas no plantel, mas a postura inconstante levou ao desempenho instável e ao mau resultado.
Colômbia: Quartos de Final
Chegamos ao último elemento a ser analisado: a Seleção Colombiana. Las Cafeteras chegaram para a sua terceira participação em Mundiais na 25.ª posição do ranking, mas com expetativas de conseguir um resultado ainda melhor do que o conseguido nas participações anteriores.
No grupo F com a Alemanha (top-2), a Coreia do Sul (top-17) e a estreante Marrocos (top-72), a Colômbia sabia que teria pela frente uma missão difícil, mas bem possível. O que não esperava, provavelmente, é que as coisas tivessem corrido tão bem como correram: após uma dominante vitória por 2-0 na estreia contra a Coreia do Sul, contou com a estrela da jovem Linda Caicedo e com um golo de Manuela Vanegas aos 90’+7’ para ganhar também à Alemanha, gerando surpresa e afirmando-se como uma equipa a ser levada a sério neste Campeonato do Mundo. As surpresas não acabaram por aí, com uma derrota para Marrocos na última jornada — resultado que, apesar de nada ter mudado para as colombianas, levou as marroquinas a um histórico apuramento aos oitavos na sua primeira participação de sempre.
A Colômbia não parou por aí, conseguindo fazer o que Brasil e França não fizeram: superar a defesa da Jamaica. Catalina Usme, aos 51' minutos, marcou o golo que levou a Las Chicas Superpoderosas aos quartos de final de um Campeonato do Mundo de forma inédita.

Estando já no final eight do Mundial, aparecia agora pelo caminho a seleção de Inglaterra, ainda invicta. Contudo, a Colômbia não se baixou frente as campeãs europeias e viu Leicy Santos abrir o marcador neste que parecia um sonho sem fim. As Colombianas tinham menos posse de bola e viam Inglaterra crescer, mas foi mesmo devido a um grande erro da guarda-redes Catalina Pérez que as Inglesas chegaram ao empate que lhes permitiu dominar o encontro. Aos 63’, mais uma falha — desta vez da defesa Daniela Arias — permitiu a Inglaterra alcançar a remontada.
A Colômbia não se deu por vencida e deu tudo em busca do empate, conseguindo 15 remates na partida, mas não bastou para evitar a eliminação. Apesar disso, campanha memorável por parte da sua seleção, que atingiu os quartos de final nesta que é o seu melhor resultado de sempre.
Resumo:
Dificuldade do grupo - 7/10
Dificuldade dos oitavos - 7/10
Dificuldade dos quartos - 9/10
Resultados obtidos - 9/10
Postura apresentada - 7/10
Conclusão: Os erros individuais num jogo tão importante evidenciam uma certa falta de maturidade, normal numa seleção emergente. A forma como o foi deixa um saber a pouco, mas trata-se, de facto, duma grande campanha realizada por parte da Colômbia.
De forma geral, quer seja pela desilusão ou pela surpresa causada, facto é que a participação das seleções sul-Americanas marcou, este Mundial. São seleções que estão ainda em crescimento, num estágio diferente das seleções mais desenvolvidas, mas que apresentam imenso potencial. O que resta é a mesma mensagem de sempre: Apoiem o Futebol Feminino; Trabalhem o Futebol Feminino; Invistam no Futebol Feminino. Só assim é que chegaremos lá.
Lucas Lemos
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